terça-feira, 22 de outubro de 2013

Canto primeiro

|Helena Carvalho

Nada começa antes do canto
que nasce outro sob a pele e dentro dos caules
húmidos e intocados,
nem o choro redondo dos pássaros
nem esta voz estrangeira que me lacera
a garganta em gomos e diz antes de mim a volúpia
e a saudade.

Canto de primeira pedra
lançada ao lume primeiro vate
dos pulsos cerzidos na substância feérica
dos ventres prematuramente acesos e
nas doze rotações dos astros.
Tremor felino do corpo e dos frutos
maturados em cada estação de fogo
na sua participação cósmica quase lunar.

Canto absoluto
nascido não da voz mas dos tímpanos
matinalmente ligados ao ressoar anónimo dos búzios
e à contínua vibração dos graves.