sábado, 11 de janeiro de 2014

Saltos Altos

|Olinda P. Gil

Quando a minha irmã ficou desempregada, ainda se arranjava como se fosse para o emprego durante muito tempo. No emprego que tinha antes era necessário ir sempre muito arranjada, fato de saia ou de calça, saltos altos, pintura sóbria e cabelo arranjado. Depois começou a cansar-se de se arranjar assim só para ficar em casa. Abandonou os saltos altos, deixou de se pintar e de arranjar o cabelo, e por fim deixou de vestir fato de saia e casaco. Aliás, chegou a uma altura em que só vestia fato de treino, porque só se sentia confortável assim.
Depois de enviar muitos currículos e de responder a muitas propostas de emprego, a minha irmã é chamada para uma entrevista. Vai ao armário e todos os seus fatos lhe estavam largos, pois tinha emagrecido desde que ficara desempregada. Escolheu um, mas teve de o mandar apertar, para que lhe servisse.
No dia da entrevista voltou a vestir-se como antes, arranjou o cabelo, pintou-se solenemente e calçou uns sapatos de salto alto. Quando está a chegar à paragem de autocarro, o que precisava de apanhar estava pronto a sair. A minha irmã teve de correr um pouco para o tentar apanhar. Foi nesse momento que caiu e partiu um pé. Já não foi à entrevista.
Estou a contar isto tudo para vos explicar o que aconteceu já depois dela ter regressado a casa com o pé engessado. O marido e os filhos foram-na encontrar sentada no chão, junto do armário onde guardava os sapatos, a cortar todos os saltos. Depois os sapatos tiveram de ser jogados para o lixo, pois ficaram um pouco estranhos, como barcos naufragados.