sábado, 8 de junho de 2013

Nos dias de 'brinchindim'

|Manuel Jorge Marmelo

Nos dias de 'brinchindim', como a minha mãe diz, o circo é ainda mais triste e melancólico do que é costume. Dá ideia que a ferrugem das rulotes fica mais escura e que é tudo muito mais feio; que os remendos da tenda grande se notam melhor e que as cores da lona estão mais desbotadas. A Mulher mais Gorda do Mundo parece ainda mais gorda e mais feia e o Lima ainda mais bruto. Nem a televisão me distrai. Os miúdos da televisão têm sempre outras crianças com quem brincar e parece que nunca chove e que nunca estão tristes. E, quando estão, acontece-lhes logo alguma coisa boa e eles ficam felizes.

Também tive vontade de a levar até à fonte para lhe mostrar as lesmas que lá vi há dias, mexendo-se muito devagarinho à beira do fio de água. Pensei que, se ela me visse pegar naqueles bichos pretos e viscosos com as mãos, de certeza que ia achar que sou um tipo sem medo de nada. Pegar em lesmas é o género de coisas que impressionam realmente uma miúda e eu acho que seria capaz de pegar nelas com as mãos e de lhes passar um dedo pelas costas e por aqueles pêlos curtos e ásperos que as lesmas maiores têm.
A minha mãe tem muito nojo das lesmas e era capaz de ficar muito zangada se soubesse que eu estou a pensar fazer uma coisa destas, mas isso não é um problema. Há coisas que as mães não têm de saber. Já basta que a Cristiana lhe tenha contado não sei bem o quê sobre o modo como eu olhava para ela enquanto mudava de roupa, e que, ao fim e ao cabo, eu tivesse sido castigado por causa disso.
Será que a miúda da lagoa se parece com a Cristiana quando não está vestida

De Somos Todos Um Bocado Ciganos