terça-feira, 3 de maio de 2011

Poemas de Arnaldo Antunes


|Arnaldo Antunes

Pensamento que vem de fora
e pensa que vem de dentro,
pensamento que expectora
o que no meu peito penso.
Pensamento a mil por hora,
tormento a todo momento.
Por que é que eu penso agora
sem o meu consentimento?
Se tudo que comemora
tem o seu impedimento,
se tudo aquilo que chora
cresce com o seu fermento;
pensamento, dê o fora,
saia do meu pensamento.
Pensamento, vá embora,
desapareça no vento.
E não jogarei sementes
em cima do seu cimento.


*

Um campo tem
terra. E coisas
plantadas nela. A
terra pode ser
chamada de chão.
É tudo o que se vê
se o campo for um
campo de visão.

*

As coisas têm peso,
massa, volume, tama-
nho, tempo, forma, cor,
posição, textura, dura-
ção, densidade, cheiro,
valor, consistência, pro-
fundidade, contorno,
temperatura, função,
aparência, preço, desti-
no, idade, sentido. As
coisas não têm paz.

*

Silêncio entre os homens que estão conversando.
Silêncio enquanto eles estão falando.
Silêncio entre um som e outro
som.
Silêncio entre som e
um outro
somem.
Silêncio entre;
não silêncio em.
Silêncio vento;
não silêncio vem.
Silêncio ventre;
não silêncio sémen – Silêncio sem.
Silêncio entre silêncios
entrem.



Publicado na revista Sítio 1, junho 2005.