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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Quem vencerá o Prémio Literário Casino da Póvoa? – 2


Apresentamos hoje os outros quatro nomeados para o Prémio Literário Casino da Póvoa. Fique a conhecer um excerto da obra dos poetas José Agostinho Baptista, Armando Silva Carvalho, Luís Filipe Castro Mendes e Bernardo Pinto de Almeida.



José Agostinho Baptista
Caminharei pelo Vale da Sombra (Assírio & Alvim)

(…)Nos tímpanos,
como um acorde desmedido,
a cava respiração dos desertos assola-te.
Contorces-te, quando me aproximo,
e benditos são os frutos do teu ventre, no oásis onde
amadurecem.
Mas não temos tempo.
Envelhecemos,
vamos e voltamos,
e ao irmos e virmos, somos a errância dos pés, entregues
à sua mecânica,
indiferentes aos pesares,
desfalecendo, retomando a marcha,
a estrada tantas vezes percorrida por uns olhos abertos
que já não vêem,
tão habituados a reter nas suas órbitas as paisagens do
desalento.(…)

*

Armando Silva Carvalho
De Amore (Assírio & Alvim)

AINDA A RAINHA DEPOIS DE MORTA

Arranca corações, esse punho cruel
que vem fustigando a história
dos amantes e chega até aos púlpitos, tronos,
e matérias de arte.

Na pedra burilada, os anjos muito agudos
pecam por desvelo.
Nas naves ressoa o bramar enrolado em raiva
da realeza sepulta:
eu amei-a viva, vocês venerem-na morta.

Foi um punho cruel.
Talvez houvesse um sexo absoluto em tanto movimento
de ouro, brocado,
soluços ébrios de temor ou de outra natureza
mais embevecida.

A história neste caso é sedutora:
traz o poder ao sol duns seios, à luz duma vagina,
abre a flor dos sentidos, desfeita
a golpes de espada,
de traição.

Aqui neste frio erguido ao redor das naves
a matéria humana
que percorre viva a tarde histórica
tem pressa de fugir
ao pesadelo:
o amor não mata, ninguém o assassina,
é ele e só ele que se expõe
já morto.

*

Luís Filipe Castro Mendes
Lendas da Índia (Dom Quixote)

AINDA A POESIA

A poesia não é feita por um nem por todos,
nem esteve nunca na rua.
A poesia está na aspereza das coisas contra nós,
tão mais nítidas ao nosso olhar isento
quanto mais doem no coração silencioso.

*

Bernardo Pinto de Almeida
Negócios em Ítaca (Relógio d’Água)

O SILÊNCIO

Ao que veio de mim queria saudá-lo
como se fosse um estrangeiro
e de entre o meio das pedras
aparecendo-me, rosto queimado de sol,
abraçá-lo e perguntar-lhe sem medo
que estradas havia percorrido. Sentando-me
com ele lado a lado, como se de mim
não viesse, saudando-o
como a um irmão sob o sol tímido
de um verão por florir, iria humilde
saber dele. Pois o próximo deve encontrar
o que lhe é próximo, o que celebra ir
junto do que quer celebrar. Assim
com o olhar quando na desmesura
de desejar a um outro reconhece em
outro olhar o idêntico, aquele que de sempre
o procurava. E indo a ele, ao que de mim veio,
oferecer-lhe onde pousar o corpo
sobre o linho, deixá-lo no repouso adormecer,
guardar-lhe o sono. Sabendo intimamente
que aos pés da esfinge
nada jamais é inútil.